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Tenho pensado tanto nisto, mas é tal o meu desconcerto que me venho recusando a vir aqui expôr o que sinto, quanto ao que se passa comigo e um pouco com todos nós. Às vezes, se penso no nosso estado mais primitivo, creio que seríamos mais felizes, saltando de galho em galho, comendo folhas, raízes, insectos e copulando sem ligação amorosa. Olhamos para esse antepassado com um certo desprezo, eramos animais, dizemos, mas então e o que somos agora?
Umas verdadeiras bestas, que tal, é isso que somos? Temos requinte na forma de magoar o nosso semelhante, já não andamos pendurados em galhos, em vez disso, sentados à sombra da bananeira urdimos com malvadez acerca da próxima vítima dos nossos jogos mentais. Para todos os efeitos, fazemos a nossa parte, lançamos movimentos para ajudar o mundo inteiro, desde que esse mundo esteja lá longe, no que nos chega à pele a conversa já é outra.
Numa altura em que os níveis de desemprego são absolutamente assustadores, e com apenas 39 anos de vida, posso dizer 'eu nunca vi as coisas neste estado'. O amanhã assusta-me, a mim, como a todos os que comigo cresceram e que reconheço em igual situação precária. As suas histórias repetem-se, maltratados, injustiçados, desprezados, postos no olho da rua de um dia para o outro.
S. é um novo caso que tomo conhecimento. A inicio a angustia, depois fico mesmo triste, recordo toda a provação a que ainda estou sujeita, mas transmito-lhe fé, mesmo se a minha já vai faltando. Desabafo com S., ninguém nos preparou para isto, ela concorda, os nossos pais deram-nos todas as condições que eles não tiveram para que alcançarmos os nossos empregos de sonho. Aliás, para nos incentivar, quando as notas não eram famosas, diziam que o nosso esforço seria sempre reconhecido e nós ingénuos acreditamos. Agora, temos as expectativas goradas e eles sentem-se profundamente culpados, porque a intenção era a melhor, mas dirá o nosso diabinho sempre à espreita 'de boas intenções está o inferno cheio'. S. continua a investir no saber, no conhecimento, quer muito estudar. Sorriu-lhe, acho inútil, tal como acreditar em deus, só servirá de almofadinha ao seu pobre ego. E isso não é pouco, atenção. Se S. conseguir dormir as noites descansadas porque sabe que continua a fazer de tudo para se construir como mulher, ser-humano e profissional, isso é de louvar. Espero no entanto que não acorde, uma noite, a meio do processo, frustrada e com a sensação de encalhanço, como se estivesse com uma obra embargada à laia das de santa engrácia.