por Cláudia Matos Silva, em 10.01.14
Quando é que descubro que ainda não sei tudo sobre mim?
Quando é que tenho a certeza que irei manter até ao resto dos meus dias uma certa ingenuidade?
Na exacta altura em que acredito que conseguirei pernoitar sob o mesmo tecto que um gigante croissant reachado com creme de ovo. Atenção, croissant não é bolo da minha eleição e muito menos o doce de ovos, mas diz o povo, o que é doce nunca amargou e quando se trata de uma compulsiva alimentar todo e qualquer bem perecível serve para matar o vício. Por sorte, leram bem, sorte, estou magra. Atentem, estou magra, isso não quer dizer que eu sou magra, nada disso. A minha natureza é de mulher gordita, mas porque estou numa maré favorável tenho-me mantido magra apesar de todos os atentados à saúde. Como todos os gordos bem sabem, a culpa só surge depois do delito cometido e a tradição cumpriu-se quando devorei o gigante croissant, carinhosamente guardado no frigorifico para levar na madrugada seguinte como presente a S. Não me senti pior pessoa por ter recusado um presente a uma amiga, afinal, onde comprei aquele bolo há muitos mais à venda mas abateu-se a culpa e a agonia que raramente atormenta os verdadeiros sanguinários. E no momento que resolvo contar o episódio ao meu querido, relativizando o triste episódio adicionando algum humor como de costume (truque mais que sabido do gordo), sinto o olhar de desapontamento sobre a minha pessoa. Dizia-me, com tristeza estampada no rosto "como foste capaz de uma coisa dessas?" e repetia a frase vezes e vezes sem conta. Observei-me, talvez tivesse as mãos manchadas de sangue, será que tinha morto alguém? Ficaria o meu querido mais tranquilo se me encontrasse com outro em vale dos lençois? Ou a tentação da gula terá sido o maior de todos os meus pecados para aquele que até ao momento considerava o meu parceiro de crime, na vida.