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A mãe esteve este fim-de-semana lá em casa. Uma alegria mesmo sabendo que a mãe, ainda não tem os dois pés bem assentes no meu chão e já está de nariz torcido, farejando sabe-se lá o quê. A mãe às vezes parece um lince, detectando falhas na limpeza doméstica, outras uma raposa buscando indícios de comportamentos errantes dos quais não terá conhecimento. A mãe na verdade é uma leoa e sustenta a sua cria, no saco há farnel para um mês que aprimoradamente confecionou com productos biológicos. A mãe, tantas vezes armada em super mulher, também é uma lontra. Vencida pelo cansaço tratando da sua imprestável filha, deitou-se no sofá a ver um desses programas de talentos na tv e adormeceu a comer ferrero rocher. Acossada pela preguiça dormiu encolhida, um tufo felino de pelo aos pés que reclamava o maiple como seu, submersa em papeizinhos de bombons amassados e no chão uma garrafa de licor sem gota, tenho a certeza que a mãe aguardava que um qualquer Ambrósio a embalasse tomando a liberdade de a levar para a cama. Em vez disso os habituais sons guturais e o total descrédito na publicidade. Há anos que o raio do mordomo promete, promete e nada.
Nunca acreditem demasiado quando dizem que vocês são muito bons. O risco de se começarem a levar a sério é febril, portanto acreditem moderadamente e com reservas.
Em miúdos reforçam-nos o ego e depositam em nós fortes expectativas, já adultos feitos, egos saturados de colesterol, cremos em surdina que todo o mundo se deveria vergar a nossos pés. Para mal de todos os pecados, o universo congemina contra nós, assim parece, ou pelo menos acreditamos, dependendo da hora do dia.
A fúria apoderasse do nosso olhar porque respirar é preciso e tantas vezes é a mais difícil de todas as tarefas. Teimosa a ruga no centro da testa, aparece por dá cá aquela palha, e começamos mais um dia de armas apontadas em jeito de estratégia de treinador de futebol “o ataque é a melhor defesa”.
A chuva molha-nos o pêlo, o frio gela-nos os ossos, o carro teima em não pegar e o primeiro café do dia está cheio de borra. Um olhar macilento alcança-nos indiferente e cospe para não estar calado "então está tudo bem?". Porque o português carrega nos seus ombros as dores de alguma pobreza de espírito alheia, em resposta, encolhemo-nos e lá seguimos para a máquina de "cafezar" , na esperança que esta bica não venha com borra e assim consigamos ver o dia com outras cores.